A Exclusão (Licenciamento ou Desincorporação) de Militares Temporários por Motivo de Saúde:

A Observância dos Direitos Garantidos sob pena de Nulidade do Ato Administrativo.

Introdução

A exclusão de militares temporários por motivo de saúde é um evento tenso, como também tema de grande importância no âmbito do Direito Administrativo Militar.

Quando se fala em evento tenso, envolve a vida de uma pessoa que retorna à vida civil, após ser licenciada por motivo de saúde, sem a menor ideia de como será o seu destino em razão das ardilosas variáveis do medo e da nuvem de ansiedade pairada sobre o curso do seu destino.

O mais comum é pensar que o militar temporário está querendo “dar o golpe” para permanecer incorporado às fileiras da Força. Em muitos casos, isso pode até ser verdade, inclusive houve condenações na Justiça Militar de União, diante de fraudes detectadas em processos de reformas simuladas.

Entretanto, o erro de alguns não pode ser suportado por àqueles militares temporários, sem estabilidade, que passam a enfrentar desafios adicionais quando adquirem doenças ou lesões durante a prestação do serviço militar. Aquilo que se percebe ao olhar direto, muitas vezes está invisível, oculto até mesmo do mais sofisticado exame criterioso.

Este artigo abordará os procedimentos legais, os direitos dos militares temporários durante e após o processo de exclusão, as implicações desse ato administrativo, com foco em militares do serviço militar obrigatório e voluntário, como oficiais superiores temporários, oficiais técnicos temporários, sargentos técnicos temporários e cabos especialistas ou músicos temporários.

Militar Temporário e o Ingresso na Carreira das Armas

Como se sabe, os militares temporários desempenham um papel vital nas Forças Armadas. Afirma-se que o efetivo desses agentes públicos é muito superior aos militares de carreira.

O serviço prestado pelos militares temporários contribui significativamente para a manutenção e operação das instituições militares. Isso porque eles compõem, completam, os quadros de pessoal das organizações militares espalhadas por todo o país – do Monte Caburaí, no município de Uiramutã (Roraima) ao Chuí (Rio Grande do Sul), no jargão comum é a linha do “Oiapoque ao Chuí”.

O ingresso dos militares temporários na carreira das armas ocorre de diferentes maneiras, vejamos as recorrentes:

  1. Serviço Militar Obrigatório: Jovens recrutados para cumprir o serviço militar obrigatório, geralmente com duração de um ano. Este serviço é essencial para a formação inicial e integração dos cidadãos nas Forças Armadas. Aqui se inclui os alunos de CPOR e de NPOR, os médicos, os farmacêuticos, os dentistas e os veterinários recém-formados.
  • Serviço Militar Voluntário, esse é um conjunto composto por:
  1. Oficiais Superiores Temporários (reconhecida competência-técnico profissional ou notório saber científico): são cidadãos que serão nomeados oficiais superiores temporários por possuírem qualificações de interesse da Força Singular, nos termos da Lei 6.880/1980 (Estatuto dos Militares);
  • Oficiais Técnicos Temporários (nível superior): são os profissionais com formação superior que ingressam voluntariamente nas Forças Armadas para prestar serviços especializados por um período determinado;
  • Sargentos Técnicos Temporários (nível técnico): são os profissionais técnicos especializados que voluntariamente se alistam para contribuir com suas habilidades específicas em diversas áreas técnicas de interesse das Forças Armadas – motoristas; técnicos em enfermagem; em radiologia; mecânicos etc.;
  • Cabos Especialistas ou Músicos Temporários (nível fundamental): são os profissionais que ingressam para atuar em funções específicas, como especialistas em diversas áreas ou músicos, desempenhando papéis importantes na rotina militar.

O ingresso pelo serviço militar obrigatório é o cumprimento de mandamento constitucional, descrito no art. 143 da Constituição da República de 1988, regulado pela Lei 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar). Esse ofício consiste no exercício de atividades específicas desempenhadas nas Forças Armadas – Marinha, Exército e Aeronáutica – e compreenderá, na mobilização, todos os encargos relacionados com a defesa nacional.

Noutra quadra, o ingresso para o serviço militar voluntário decorre de chamamento público, onde os inscritos submetidos a processo seletivo simplificado para incorporação no serviço ativo como oficial subalterno ou praça temporário, observados os seguintes requisitos: I – a idade máxima para o ingresso será de 40 anos; e II – a idade-limite para permanência será de 45 anos. Há outros requisitos que são exigidos para determinados cargos, como altura, sexo, idade etc. Esses dados sempre estarão previstos no edital do processo.

A Lei 13.954/2019 trouxe outra categoria para o serviço temporário nas Forças Armadas que é o Oficial Superior Temporário. Para o ingresso, além dos requisitos descritos na alínea “a)”, observa-se: I – a idade máxima dos voluntários será de 62 anos e a idade-limite de permanência será de 63 anos; e II – aos médicos, aos dentistas, aos farmacêuticos e aos veterinários que ingressarem como oficial superior temporário não serão aplicadas as disposições da Lei 5.292/1967.

Assim, esses militares temporários, embora sem a estabilidade que é assegurada aos militares de carreira, são fundamentais para a operacionalidade e a eficiência contínua das Forças Armadas, desempenhando funções técnicas necessárias nos quadros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.

Procedimentos Legais de Ingresso e de Exclusão (Licenciamento ou a Desincorporação)

            Os procedimentos legais para o ingresso e a exclusão de militares das Forças Armadas são bastante criteriosos e variam de acordo com o cargo a ser ocupado pelo militar voluntário.

            Vejamos algumas situações.

  1. O ingresso

O processo seletivo para o ingresso passa por uma série de fases, que variam conforme seja o tipo de serviço militar – obrigatório ou voluntário. Entretanto, o ponto em comum é a obrigatoriedade de realizar uma inspeção de saúde.

            A inspeção de saúde é um requisito legal e essencial nesse processo seletivo.

Importante destacar que todos os cidadãos – voluntários ou não – passam por essa inspeção de saúde, quando será confeccionada uma Ata de Inspeção de Saúde onde constatará a situação de o militar ter “aptidão física e mental para o exercício das atividades”.

Com esse documento administrativo, que possui fé pública, o militar incorporará às fileiras da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica.

  • A Exclusão (Licenciamento ou a Desincorporação)

O militar temporário que será excluído da Força Armada também seguirá por um processo administrativo, no qual prevê a fase da inspeção de saúde para o seu desligamento.

Como o artigo trata da exclusão do militar temporário por motivo de saúde, exclui-se os demais requisitos que podem afastar o militar das fileiras da Força.

O motivo de saúde pode decorrer de diversas origens, as mais comuns são os acidentes em serviço ou doenças adquiridas durante a prestação do serviço militar.

É muito importante saber que o acidente em serviço deve ser registrado imediatamente – por meio de uma ocorrência (parte) de acidente em serviço –, a qual constará todos os dados para identificar a causa do acidente – data, horário, evento realizado na atividade, publicação dessa atividade, possíveis lesões decorrentes etc.

A lei considera acidente em serviço, para as Forças Armadas, aquele que ocorra com militar da ativa, quando: i) no exercício de atividades militares (instruções); ii) no exercício de suas atribuições funcionais, durante o expediente normal, ou, quando determinado por autoridade competente, em sua prorrogação ou antecipação; iii) no cumprimento de ordem emanada de autoridade militar competente; iv) no decurso de viagens em objeto de serviço, previstas em regulamentos ou autorizados por autoridade militar competente; v) no decurso de viagens impostas por motivo de movimentação efetuada no interesse do serviço ou a pedido; e vi) no deslocamento entre a sua residência e a organização em que serve ou o local de trabalho.

O acidente em serviço resulta no chamado Atestado de Origem.

Quando os agentes militares responsáveis pela atividade castrense, onde ocorreu o acidente em serviço, não se atentam para registrar esse evento, a solução é a abertura de inquérito sanitário de origem, o qual vai averiguar as circunstâncias apresentadas pelo militar temporário que sofreu as lesões decorrentes de acidente em serviço.

As doenças adquiridas durante a prestação do serviço militar é outra causa que impõe a exclusão do militar temporário e a situação concreta vai ser verificada por ocasião da fase de inspeção de saúde para fins de licenciamento.

Nos dois casos, o militar será submetido à inspeção de saúde como requisito legal e essencial para a sua exclusão da Força Armada a que serve.

Inspeção de Saúde para fins de Exclusão (Licenciamento ou a Desincorporação)

A inspeção de saúde é uma perícia médica ou médico-legal, de interesse da Força Armada, realizada por agente especializado designado pela Administração Militar, por determinação formal de autoridade competente, com finalidade específica definida em normas internas, destinada a verificar o estado de saúde física ou mental do inspecionado.

Quando do ingresso, o militar temporário passou por essa inspeção de saúde e foi considerado “apto para o serviço militar”. Então, essa avaliação médica está registrada em suas alterações militares e publicada nos boletins internos da organização militar.

A inspeção de saúde do militar temporário é o principal evento no processo de exclusão por motivos de saúde. Esta avaliação é realizada por médicos das Forças Armadas, que utilizam critérios específicos para determinar a aptidão ou inaptidão do militar para o serviço.

Como se trata de situação muito delicada, o militar temporário vai ser submetido à junta de inspeção de saúde, que é formada por um grupo de médicos especializados, responsáveis por realizar uma avaliação detalhada do estado de saúde do militar.

O processo inclui exames clínicos, laboratoriais e de imagem, além da análise do histórico médico do militar. A junta de inspeção de saúde é essencial para garantir uma avaliação imparcial e precisa sobre a situação física e mental do militar temporário para respaldar a sua exclusão da Força.

Com o resultado, o militar temporário será notificado sobre a sua avaliação e a decisão emitida pela junta de inspeção de saúde, registrada na ata de inspeção de saúde para fins de exclusão das Forças Armadas.

A lei dispõe que o militar temporário, enquadrado em uma das hipóteses de acidente em serviço ou de doença incapacitante para o serviço militar, mas não for considerado inválido para qualquer atividade laboral, pública ou privada, será licenciado ou desincorporado.

Portanto, mesmo que o militar temporário seja considerado inválido para o serviço militar, o seu licenciamento ou a sua desincorporação pode ser publicada em boletim interno, sem direito a ser reformado.

Observância dos Direitos Garantidos sob pena de Nulidade do Ato Administrativo

O processo administrativo de exclusão (licenciamento ou desincorporação) começa com a notificação do militar sobre a decisão da junta de inspeção de saúde. O militar tem o direito de apresentar a sua defesa e solicitar uma segunda opinião médica, se necessário.

O processo inclui prazos específicos para a apresentação de documentos e recursos, garantindo que o militar tenha tempo suficiente para preparar sua defesa. A defesa contesta a decisão descrita na ata de inspeção de saúde, a qual considerou que o militar não inválido para outras atividades públicas ou privadas, apresentando outros dados e/ou avaliações sobre a sua incapacidade.

O recurso administrativo pode chegar até a uma junta superior de saúde, caso contrário, a saída será buscar assistência jurídica, podendo ser representados por um advogado durante todo o processo.

A negativa de observância desses direitos, ensejará na necessidade de buscar a justiça para, por meio de decisão liminar, evitar a exclusão (licenciamento ou desincorporação), no sentido de manter a sua remuneração e o tratamento de saúde.

Mesmo após a exclusão (licenciamento ou desincorporação), a justiça pode determinar a reintegração do militar temporário, para restabelecer os seus direitos a certos benefícios, a depender da situação específica.

Há casos notáveis de exclusão e, na sequência, de reintegração pode ordem judicial, para os quais a jurisprudência mais atualizada pode oferecer uma visão prática, no sentido de como os tribunais tratam a exclusão de militares por motivos de saúde.

A partir de 17.12.2019, com a entrada em vigor da Lei 13.954/2019, é importante saber que as decisões judiciais são mais relevantes do ponto de vista de aplicação da nova legislação castrense. Essa nova lei restringiu bastante os direitos dos militares temporários, passando a estabelecer precedentes importantes, em especial nessa questão de exclusão por motivo de saúde.

Finalmente, o impacto pessoal da exclusão é tão profundo, que afeta o bem-estar psicológico e social do militar temporário e de sua família. A perda da identidade profissional e a sensação de inutilidade podem levar a problemas de saúde mental. É importante que os militares tenham acesso a suporte psicológico e programas de reintegração social para ajudar na transição para a vida civil.

Conclusão

A exclusão do militar temporário ou de carreira por motivos de saúde tem impactos significativos em sua vida. Inclui a perda de oportunidades de promoção, de participação em cursos de especialização e, em muitos casos, a reforma precoce. A perda financeira também é substancial, afetando não apenas o militar, mas a sua família.

Procedimentos administrativos claros e suporte adequado aos militares excluídos são essenciais para assegurar a justiça e a dignidade no serviço militar. Em casos de inobservância dos direitos, a assistência jurídica especializada pode ser fundamental para anular o ato administrativo e garantir a reintegração do militar.

Ademais, a incapacidade do militar temporário detectada ao longo da prestação do serviço castrense – obrigatório ou voluntário – pode ensejar nos casos de reforma, garantindo-lhe a remuneração e o tratamento de saúde, como decorre da própria lei que dispôs sobre o Sistema de Proteção Social dos Militares.

Se você é um militar temporário enfrentando um processo de exclusão por motivos de saúde, é crucial conhecer seus direitos e os procedimentos legais envolvidos. Entre em contato com nosso escritório para obter orientação jurídica especializada e assegurar que seus direitos sejam protegidos.