O Intricado Cenário do Acúmulo de Pensões Militares: Uma Análise Jurídica Sobre a Contribuição de 1,5%, a Regra de Transição e os Limites da Segurança Jurídica

1        Introdução

Há no Direito certos temas que, à primeira leitura, podem parecer meramente técnicos. Entretanto, quando se observa com lente mais apurada, percebe-se que envolvem não apenas regras, mas também vidas.

Além de histórias e legados inegociáveis.

No seio do Direito Militar Previdenciário, poucas matérias são tão sensíveis — e, ao mesmo tempo, tão desafiadoras — quanto a discussão acerca da possibilidade de acúmulo de pensões militares no contexto da Medida Provisória nº 2.215-10/2001 e da Lei nº 3.765/1960.

Neste artigo, proponho uma análise meticulosa, didática e profundamente reflexiva sobre cada uma das situações práticas enfrentadas no cotidiano dos pensionistas militares, à luz dos pareceres técnicos e das manifestações oficiais do Ministério da Defesa e da Advocacia-Geral da União.

2        O Marco Jurídico: Entre o Direito Extinto e o Direito Preservado

Antes de adentrar nas situações específicas, impende recordar que, até a edição da MP nº 2.215-10/2001, vigorava no ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade expressa de:

Acúmulo de duas pensões militares, nos termos do art. 29, “a”, da Lei nº 3.765/1960;

Pensão vitalícia para filhas maiores solteiras, também prevista na redação originária da referida lei.

Ambas foram extintas com a nova sistemática, salvo para aqueles que, amparados pela regra de transição do art. 31 da MP nº 2.215-10, optaram por manter os benefícios mediante o pagamento da contribuição adicional de 1,5% sobre as parcelas constantes do art. 10 da MP.

Vale ressaltar que a opção de “manter os benefícios” da legislação castrense anterior não se restringia apenas a questão da pensão militar, mas sim, os demais benefícios que foram suprimidos.

Esse é um tema nebuloso que não vi ninguém o tratar até este artigo. Podemos desenvolvê-lo em outro momento, se houver interesse, é claro, mas preciso que comentem e compartilhem essa publicação.

3        A Tese Jurídica Está Consolidada? Sim, Mas Com Condições Claras

A regra é simples na teoria, mas profundamente complexa na prática:

i) Para se manter direitos extintos, como o acúmulo de pensões militares, é imprescindível que o militar tenha sido contribuinte dos 1,5%;

ii) Esse pagamento é pessoal, individualizado e não se comunica entre os instituidores;

Portanto, a análise da possibilidade de acumulação depende de quem pagou, se pagou, e de qual benefício está sendo pretendido ser questionado.

4        Análise Individualizada de Cada Situação Prática

A seguir, desdobramos, de maneira técnica e elegante, cada uma das situações contempladas no parecer jurídico da AGU.

4.1 Quando o pai da pensionista era contribuinte dos 1,5% e o marido militar não era

Nesta hipótese, subsiste um cenário de plena possibilidade de acumulação.

4.1.1) O pai, ao aderir ao pagamento da contribuição específica de 1,5%, preservou os direitos extintos pela MP nº 2.215-10/2001, dentre eles a possibilidade de sua filha — mesmo maior de idade e solteira — ser beneficiária de pensão militar.

4.1.2) Por outro lado, o marido militar, não sendo contribuinte dos 1,5%, deixou pensão segundo as regras vigentes após a MP, que continuam assegurando a pensão militar quando vier a falecer.

Assim, formam-se duas pensões juridicamente distintas em sua origem:

• Uma, amparada pelo regime anterior, preservado pela adesão do pai ao pagamento dos 1,5%;

• Outra, derivada do regime atual, oriunda da morte do cônjuge, sem qualquer necessidade da contribuição extraordinária.

Conclusão: Neste cenário, o acúmulo de pensões é plenamente possível, desde que respeitado o limite do teto constitucional.

4.2 Quando o marido era contribuinte dos 1,5% e o pai não era

Aqui, desenha-se um quadro diametralmente oposto.

4.2.1) O pai, ao não ter optado pelo pagamento da contribuição adicional, não preservou para si os direitos do regime anterior, de modo que sua filha não faz jus à pensão na qualidade de filha maior solteira, pois tal benefício foi extinto.

4.2.2) O marido, sendo contribuinte dos 1,5%, garante à sua esposa o direito à pensão militar, a qual, contudo, advém do título de cônjuge viúva, direito que sempre esteve preservado, com ou sem a contribuição extraordinária.

Portanto, não se admite o acúmulo, pois a pensão do pai sequer existe juridicamente, dada a ausência de preservação do regime anterior.

Conclusão: Acúmulo inviável. A pensionista faz jus apenas à pensão do cônjuge militar.

4.3 Quando pai e mãe, ambos militares, eram contribuintes dos 1,5%

Neste caso, perfaz-se o cenário jurídico ideal sob o ponto de vista do acúmulo.

Tanto o pai quanto a mãe, ao optarem pelo pagamento dos 1,5%, preservaram integralmente os benefícios do regime anterior, incluindo:

4.3.1) O direito de instituir pensão para filha maior solteira;

4.3.2) E o direito de tal pensão ser cumulativa.

Ambos os vínculos previdenciários estão juridicamente amparados pela regra de transição e, portanto, são plenamente válidos.

Conclusão: Acúmulo plenamente possível. A pensionista recebe duas pensões militares oriundas do mesmo regime jurídico anterior, preservado pela adesão dos dois instituidores.

4.4 Quando apenas um dos pais militares era contribuinte dos 1,5%

Aqui, surge uma linha divisória muito clara no plano jurídico.

4.4.1) O genitor que aderiu à contribuição dos 1,5% manteve para si os direitos do regime anterior, podendo, portanto, instituir pensão para sua filha maior solteira.

4.4.2) Contudo, aquele que não realizou o pagamento dos 1,5%, perdeu tal prerrogativa, não podendo transmitir direito previdenciário que não subsiste juridicamente.

A pensão do pai ou da mãe que não contribuiu não existe no ordenamento jurídico atual, uma vez extinta pela própria MP nº 2.215-10/2001.

Conclusão: Não há acúmulo. A pensionista percebe apenas a pensão vinculada ao instituidor que aderiu à manutenção dos direitos do regime anterior.

4.5 Quando pai e mãe falecidos eram militares e o beneficiário é filho menor, inválido ou estudante até 24 anos — e pelo menos um dos pais contribuiu com os 1,5%

Aqui, a lógica é significativamente distinta dos casos anteriores.

4.5.1) A pensão para filhos menores, inválidos ou estudantes até 24 anos sempre esteve assegurada, mesmo no regime atual da MP nº 2.215-10/2001.

4.5.2) O que a MP suprimiu não foi o direito à pensão desses dependentes, mas sim a possibilidade de acumular duas pensões militares simultaneamente.

Portanto, quando pelo menos um dos pais contribuiu com os 1,5%, viabiliza-se a manutenção da possibilidade de acumulação de pensões militares, rompendo, nesse ponto específico, a vedação imposta pelo novo art. 29 da Lei nº 3.765, com redação da MP.

Conclusão: Acúmulo permitido. A condição é que, no mínimo, um dos pais tenha aderido à contribuição dos 1,5%.

5        O Teto Constitucional: A Limitação Final

A limitação final está no teto constitucional.

Isso porque, ainda que juridicamente possível, o acúmulo de pensões militares — seja por preservação de regimes anteriores, seja por combinação com o regime atual — não escapa à barreira do teto constitucional, nos termos do art. 37, XI, da Constituição Federal.

Hoje, está no patamar de R$ 46.366,19 (quarenta e seis mil trezentos e sessenta e seis reais e dezenove centavos), a partir de 1º de fevereiro de 2025, nos termos do art. 1º, inciso III, da Lei nº 14.520/2023.

Ou seja, os valores das pensões deverão ser somados, e seu resultado não poderá ultrapassar o subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

6        Reflexão Final: Direito Não É Sorte. É Técnica, História e Justiça.

O debate aqui exposto não se resume a frias fórmulas legislativas.

O artigo revela, de maneira contundente, como escolhas administrativas feitas há décadas — como a opção pelo pagamento dos 1,5% — reverberam até hoje na vida de pensionistas.

São decisões que atravessam gerações, impactando não apenas finanças, mas a dignidade de famílias que, muitas vezes, constroem sua própria história sobre o alicerce do serviço prestado à Pátria.

Pense nisso!!!

7        Conclusão: Ponderar é Dever. Agir é Sabedoria.

Se este tema encontra ressonância em sua realidade ou na de alguém próximo, que esta reflexão sirva não como um mero texto, mas como um convite:

O convite à prudência.

O convite à busca por esclarecimento técnico qualificado.

E, acima de tudo, à preservação da segurança jurídica que deve amparar todos aqueles que serviram — e continuam servindo — ao Brasil.

Como dito anteriormente, o Direito, quando bem praticado, não é apenas técnica — é arte, estratégia e proteção, isso vale em todos os seus ramos, principalmente nos campos que atuamos – cível, previdenciário, trabalhista e militar.

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