Preciso de advogado para me acompanhar no Inquérito Policial?

Inquérito Policial: preciso constituir advogado desde o início?
Aguardo a abertura do processo penal?

Silvio César Cardoso de Freitas
Advogado. Mestre em Direito. < http://lattes.cnpq.br/7226169340710903>

1 O MEDO DE SER MAL INTERPRETADO PELA AUTORIDADE POLICIAL NO INÍCIO DA INVESTIGAÇÃO

1.1 O assunto exposto neste trabalho visa esclarecer uma dúvida – muitas vezes travestida de medo de ser mal interpretado – que acomete as todas as pessoas, quando são intimadas para prestar esclarecimentos no âmbito de inquérito policial (IPL) ou de inquérito policial militar (IPM), se constituem ou não advogado para lhe acompanhar nessa oitiva.

1.2 Se eu for acompanhado de advogado, a autoridade pública pode pensar que estou envolvido no caso e isso poderá complicar ainda mais a minha situação. A ansiedade toma conta da pessoa e, nesse caso, o medo impede o raciocínio correto sobre a defesa que pode ser efetivada desde o início do caso.

1.3 A surpresa é a primeira reação que a pessoa tem, quando recebe uma intimação policial, logo em seguida busca levantar o porquê de estar sendo chamada para depor em sede inquérito. Essa angústia inicial é uma reação normal, sem dúvida, de qualquer ser humano, especialmente se ele não tem a menor ideia do que está sendo investigado neste inquérito policial.

1.4 Ademais, todos sabemos que, ao ser notificado para prestar depoimento em inquérito policial, independentemente de nosso nível de escolaridade, a autoridade pública abriu esse procedimento para investigar um ou vários crimes. Tão logo chamado a depor, o cidadão percebe que o delegado de polícia – encarregado do inquérito policial militar – está em busca de identificar os autores desses crimes em apuração.

1.5 Portanto, diante do pavor de ser mal interpretado, o cidadão pode prejudicar a si mesmo, inclusive mentalmente, quando acaba bloqueando o seu raciocínio para estabelecer a melhor estratégia de responder adequadamente o chamamento policial.

2 AS PRIMEIRAS DECLARAÇÕES: A FORMAÇÃO INICIAL DO CADERNO PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL

2.1 Com a abertura da investigação, todas as pessoas citadas serão chamadas à presença da autoridade policial para prestar as suas declarações sobre os fatos que estão sendo investigados.

2.2 Na multiplicidade das intimações policiais constituídas em sede inquérito policial, não há a descrição pormenorizada do “inteiro teor” dos fatos objeto desta investigação. Além disso, o documento público que formaliza essa intimação vem de forma simples, contendo apenas o nome do cidadão, a data, a hora e o local onde deve comparecer para prestar as suas declarações.

2.3 Ou seja, o cidadão está na “total escuridão”, pois foi chamado a depor sem saber as informações mais básicas sobre o caso. É uma situação assustadora, somada ao receio de ser mal interpretado se for acompanhado de advogado.

2.4 Assim, com essas primeiras declarações começa a formação do caderno chamado de elementos de informação [1], o qual vai sendo constituído com toda e qualquer notícia capaz de elucidar o crime e permitir, no futuro, que o ministério público possa oferecer a denúncia e iniciar o processo criminal.

2.5 O alerta que se dá, diante dessas situações, à pessoa intimada, logo no início, é não se deixar dominar pelo medo de ser mal interpretada e contratar um profissional que lhe transmita confiança para defender os seus direitos.

2.6 A situação se torna ainda mais séria se o cidadão já, de plano, é intimado na condição de investigado, o qual está a um passo de ingressar na condição de sub judice [2] para responder a um processo criminal.

2.7 Nessa quadra, como a investigação de crime é ato de competência do Estado, em regra, a forma como se instaura o inquérito policial, as atribuições da autoridade de polícia judiciária e os meios formais de comunicação usados para realizar as diligências são atos administrativos e necessitam de requisitos próprios e estão previstos em lei.

2.8 Em nossa óptica, o papel do advogado, desde o início e no decorrer das investigações, pode evitar todo esse constrangimento, pois o especialista intervirá no momento oportuno, inclusive com a utilização de recursos de investigação defensiva, impedido que o depoente possa levantar ou produzir que a formação do caderno probatório lhe seja desfavorável.

3 A PRESTAÇÃO DO DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA, DO INDICIADO, DO OFENDIDO, DO INVESTIGADO, DO INFORMANTE etc.

3.1 A lei estabelece que o depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido levá-lo por escrito para fazer a leitura na frente da autoridade policial.

3.2 Esse é um dos principais motivos pelos quais não se pode “construir histórias”.

3.3 Muitas vezes, as pessoas são orientadas, de forma completamente equivocada, a construir uma narrativa e contá-la à autoridade policial no primeiro momento e, dessa forma, sustentá-la até o final.

3.4 À primeira vista parecerá factível e até mesmo tentador seguir essa linha de raciocínio para afastar as suspeitas que recaem sobre a pessoa que irá prestar o seu depoimento. Porém, se o advogado for realmente especialista, ele não permitirá que o seu cliente caia nessa armadilha.

3.5 Explico. A razão disso está no fato de lei determinar que o “depoimento será prestado oralmente”, isso porque as autoridades públicas e os servidores dos órgãos relacionados – juízes, promotores de justiça, delegados de polícias, escrivães, analistas e técnicos – são agentes estatais altamente treinados para captar as minúcias do interrogatório que a pessoa está prestando.

3.6 Pode-se afirmar que o nosso corpo “fala”, e a linguagem corporal é uma forma de comunicação não-verbal, onde os gestos, as expressões faciais, as mudanças de posturas ante as indagações que se apresentam ao longo do interrogatório vão, sem sombra de dúvida, formar a convicção da autoridade.

3.7 Assim, se a pessoa estiver mentindo em suas declarações, isso ficará nítido, pois as “falas corporais” servirão para acusar o cidadão. Assim, nesse caso, em vez de se livrar daquela situação desagradável, o que vai acontecer é uma nova intimação para retornar a prestar depoimento.

3.8 Se a pessoa chamada a prestar depoimento em sede de inquérito, seja qual for a sua condição – testemunha, indiciado, ofendido, investigado, informante etc. – encarar de frente os seus medos e, antes de ir até a delegacia, procurar um advogado especialista para lhe tranquilizar, ou mesmo a acompanhar nesse ato, entenderá que não a sua participação não precisar ser ativa, não necessita formar a convicção da autoridade sobre os fatos, mas apenas responder ao que lhe for perguntado dentro do escopo da própria investigação.

4 CONCLUSÃO

4.1 A função estatal de investigação de crimes é ato relacionado à segurança pública, sendo dever do Estado o seu pleno exercício para preservar a ordem pública, a integridade das pessoas e o seu patrimônio.

4.2 O Inquérito Policial (e também o IPM) é um procedimento, e não um processo. Essa diferença é importante, pois a diferença revela que um procedimento é uma sequência de atos concatenados visando um fim.

4.3 O pavor que a pessoa tem, quando é chamada a depor, está no fato de fazer alguma afirmação falsa, calar ou negar a verdade sobre o que está sendo perguntado, exatamente por não saber o objeto da investigação.

4.4 Nesse momento, a presença do advogado abranda todo esse temor, juntando elementos que apontem para outro lado a ocorrência de um crime que possa envolver o seu cliente, ou, se ele estiver envolvido realmente, que não produza provas contra si durante toda a investigação.

5 REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil (1988). Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03 /Constituição /Constituição.htm>. Acesso em 25.1.2022.

________. Decreto-Lei nº 2.848, de 7.12.1940. Código Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em 25.1.2022.

________. Decreto-Lei nº 3.689, de 3.10.1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em 25.1.2022.

________. Decreto-Lei nº 1.001, de 21.10.1969. Código Penal Militar. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1001.htm>. Acesso em 4.1.2022.

________. Decreto-Lei nº 1.002, de 21.10.1969. Código de Processo Penal Militar. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1002.htm>. Acesso em 25.1.2022.

________. Legislação. Lei nº 13.709, de 14.8.2018, Lei Geral de Proteção de Dados ( LGPD). Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm>. Acesso em 25.1.2022.

SILVA, Márcio Alberto Gomes. Inquérito Policial – uma análise jurídica e prática da fase pré-processual. Salvador:JusPODIVM, 5. Ed., revista, ampliada e atualizada. 2020.

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[1] Chamaremos a partir daqui de provas ou de caderno probatório, apenas para facilitar o entendimento, pois como se sabe as provas são definidas ao longo da instrução processual, sob o crivo do contraditório.

[2] A situação do militar à disposição da Justiça – Sub judice. < https://perfilremovido1643242551188165225.jusbrasil.com.br/artigos/1350497700/a-situacao-do-militaradisposicao-da-justiça-sub-judice>. Acesso em 28.1.2022.

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